domingo, 3 de fevereiro de 2008

ALGODOEIRO

Tentou roubar uma cópia absolutamente sem valor de um Algodoeiro retorcido numa paisagem deserta e seca do Hotel Chateau Marmont no Sunset Boulevard.
Pegaram-no com ela no estacionamento, jogando-a no bagageiro da caminhonete.
Quando lhe perguntaram por que, respondeu que não tinha certeza.
Disse que lhe dava essa sensação. Disse que via a si próprio dentro deste quadro, deitado de costas, embaixo do Algodoeiro.
Disse que reconhecia a árvore de um velho sonho e que o sonho era baseado numa árvore real da qual se lembrava vagamente, de muito tempo atrás, na sua infância.
Lembrava-se de deitar embaixo da árvore e contemplar as folhas prateadas.
Lembrava-se das vozes daquelas folhas, mas não conseguia lembrar o que as vozes diziam ou a quem pertenciam.
Disse que esperava que o quadro o relembrasse de tudo.


______________________________________________________________25/07/1981 - Hollywood, Califórnia.

Sam Shepard
Do livro Crônicas de Motel.

Um comentário:

Angela disse...

Bonito! E, não é que estas coisas costumam acontecer com a gente? Nem sempre precisamos roubar quadros ou algo mais mas, é assim mesmo! Lembranças fugidias, sensações e sentimentos estranhos. Muito bom este conto. Não sei quem é este autor.Onde o descobriu Wilson?